Classe gramatical: 
loc. subst.
Definição: 

1. Conjunto de prĂĄticas pedagĂłgicas que tĂȘm por objetivo conscientizar o indivĂ­duo da estrutura e do funcionamento do racismo na sociedade e tornĂĄ-lo apto a reconhecer, criticar e combater atitudes racistas em seu cotidiano.

2. Esse processo de conscientização.

3. Conhecimento e percepção adquiridos nesse processo.

[TambĂ©m denominado letramento racial crĂ­tico.]

Exemplos de uso: 

“VocĂȘ jĂĄ ouviu falar em letramento racial? Sabe o que Ă© e como se faz? Esse conceito remete Ă  racialização das relaçÔes, ou seja, o estabelecimento arbitrĂĄrio de direitos e lugares hierarquicamente diferentes para brancos e nĂŁo brancos, que legitima uma pretensa supremacia do branco. Portanto, o racismo pode (e precisa) ser desconstruĂ­do, combatido, o que implica necessariamente lutar para que todos sejam efetivamente reconhecidos como cidadĂŁos e que tenham de fato seus direitos garantidos. Como nos diz a psicĂłloga e pesquisadora Lia Vainer Schuman, o letramento racial estĂĄ relacionado principalmente com a necessidade de desconstruir formas de pensar e agir que foram naturalizadas. Se nĂŁo admitirmos que nossa sociedade Ă© organizada a partir de uma perspectiva eurocĂȘntrica e orientada pela lĂłgica do privilĂ©gio do branco, trabalharemos com uma falsa e insustentĂĄvel ideia de igualdade, porque o racismo Ă© estrutural e institucional.”1

“No artigo ‘Letramento Racial: Um Desafio para Todos NĂłs’, a sociĂłloga Neide A. de Almeida discorre sobre como todo letramento Ă© polĂ­tico e construtor de sentidos. Para combater o racismo, os sistemas de ensino e de formação devem inserir dentro de seus currĂ­culos prĂĄticas antirracistas. ‘Letramento racial Ă© construção de referĂȘncia para a vida. O que eu conheço como mundo, minha visĂŁo Ă© construĂ­da a partir das referĂȘncias que eu tenho quando eu decido entrar no educar. E nĂłs negros raramente temos referĂȘncias de boas prĂĄticas ou outras possibilidades que nos inspirem. Nos livros, nas novelas, mĂșsicas, o corpo negro Ă© posto como nascido para ocupar determinado espaço subalterno’, explica Diane.”2

“A antropĂłloga afro-americana France Winddance Twine formulou o conceito de racial literacy, traduzido pela psicĂłloga e pesquisadora Lia Vainer Schucman como ‘letramento racial’. O letramento racial Ă© uma forma de responder individualmente Ă s tensĂ”es raciais. Ao lado de respostas coletivas, na forma de cotas e polĂ­ticas pĂșblicas, ele busca reeducar o indivĂ­duo em uma perspectiva antirracista. A ideia subjacente Ă© a de que quase todo branco Ă© racista, mesmo que nĂŁo queira, porque o racismo Ă© um dado estrutural de nossa formação social. Explica Schucman que o letramento racial Ă© um conjunto de prĂĄticas, baseado em cinco fundamentos. O primeiro Ă© o reconhecimento da branquitude. O indivĂ­duo reconhece que a condição de branco lhe confere privilĂ©gios. O segundo Ă© o entendimento de que o racismo Ă© um problema atual, e nĂŁo apenas um legado histĂłrico. Esse legado histĂłrico se legitima e se reproduz todos os dias e, se nĂŁo for vigilante, o indivĂ­duo acabarĂĄ contribuindo para essa legitimação e reprodução. O terceiro Ă© o entendimento de que as identidades raciais sĂŁo aprendidas. Elas sĂŁo o resultado de prĂĄticas sociais. O quarto Ă© se apropriar de uma gramĂĄtica e de um vocabulĂĄrio racial. O quinto Ă© a capacidade de interpretar os cĂłdigos e prĂĄticas ‘racializadas’.”3

“O processamento legal do Caso JoĂŁo Alberto Silva, assassinado na loja do Carrefour de Porto Alegre, em novembro de 2020, alĂ©m da prisĂŁo e processamento dos responsĂĄveis pela sua morte, da mesma forma, antes mesmo da condenação promoveu a indenização de todos os familiares, e, num acordo extrajudicial feito num TAC – Termo de Ajustamento de Conduta –, assinado com o MinistĂ©rio PĂșblico Federal, Estadual, MinistĂ©rio PĂșblico Federal do Trabalho, Defensorias Publica Federal e Estadual, resultou na maior indenização por crime racial empresarial da histĂłria do paĂ­s; e um dos maiores do mundo. (...) AlĂ©m disso, o Carrefour decidiu internalizar e requalificar toda a segurança, acordou a contratação de 30 mil funcionĂĄrios negros e a formação de outros 80 mil entre ensino fundamental, mĂ©dio e universitĂĄrio e a formação em letramento racial dos seus gestores e fornecedores, no prazo de trĂȘs anos.”4

“Outras escolas tambĂ©m começaram a fazer mudanças estruturais e curriculares desde a entrada dos coletivos de pais. O Gracinha, no Itaim Bibi, e a Escola da Vila sĂŁo dois bons exemplos. PatrĂ­cia Moura e Souza, negra e mĂŁe da escola, conta que o trabalho do coletivo de pais dentro da Escola da Vila reforçou a necessidade de se olhar para questĂ”es raciais. ‘Como qualquer cidadĂŁo – a gente sĂł descobre quanto chĂŁo ainda tem pela frente quando começa a fazer um letramento racial’, diz. ‘O que mais comemoramos foi a decisĂŁo da escola de implementar um processo de transformação com uma assessoria antirracista especializada num projeto mais transversal e sistĂȘmico ao longo do tempo’, conta PatrĂ­cia. ‘Essa Ă© uma das notĂ­cias que mais nos deixou contente. Mesmo uma instituição que jĂĄ tem atenção para a questĂŁo racial, vamos aprender absurdamente com um projeto real e profundo de transformação para uma educação ativamente antirracista’.”5

“Apesar de ser pouco conhecido, o termo letramento racial refere-se Ă  conscientização sobre a luta antirracista na sociedade. De acordo com Ton Mendes, gerente geral do ID_BR, organização que oferece soluçÔes a empresas que procuram diminuir desigualdades raciais, as empresas que buscam ter mais equidade de gĂȘnero devem começar com esse aspecto mais didĂĄtico. Ele serve para fazer o pĂșblico interno entender o que Ă© o racismo estrutural brasileiro e para que alguns conceitos sejam apresentados, como cor, raça, racismo, viĂ©s inconsciente, cotas e branquitude: ‘Muitas empresas tĂȘm grupos que foram formados, mas nem sempre eles conseguem se organizar e muitos nĂŁo conhecem a pauta racial. Existe uma lenda de que quanto menos se fala, mais algum ponto se resolve. Mas nĂŁo Ă© verdade. Quanto mais a gente falar, mais as pessoas vĂŁo ficar esclarecidas.’”6

“As mulheres negras tĂȘm muito mais a oferecer alĂ©m da pauta racismo. O antirracismo Ă© urgente e deve ser discutido, mas a carga jĂĄ Ă© pesada para quem sofre diariamente o preconceito na pele. A consulta sobre a questĂŁo Ă© incessante mesmo para quem nĂŁo deseja tocar no assunto ou nĂŁo tem letramento racial. A amiga negra vira o ‘afrogoogle’ ou a ‘wikipreta’. Para Luana GĂ©not, diretora executiva do ID_BR e colunista da Revista ‘Ela’, hĂĄ uma percepção errada na sociedade de que sĂł as mulheres negras tĂȘm raça, jĂĄ que o efeito do racismo afeta a todos, em diferentes escalas. – Acho que mais mulheres brancas deveriam ser chamadas para falar sobre seus privilĂ©gios, sobre elas terem a centralidade das fontes, serem sempre representantes de um todo. Temos que convidar pessoas brancas para esse debate. A raça Ă© associada Ă s mulheres negras, enquanto todos nĂłs temos raça: branco tambĂ©m Ă© raça. A luta Ă© para que mulheres negras possam ter narrativas alĂ©m da questĂŁo racial, porque somos mĂșltiplas em nossas identidades.”7

 Fonte: https://www.academia.org.br/nossa-lingua/nova-palavra/letramento-racial


1 ALMEIDA, Neide A. de. Letramento racial: um desafio para todos nĂłs. Portal GeledĂ©s, 28 out. 2017. DisponĂ­vel em: https://www.geledes.org.br/letramento-racial-um-desafio-para-todos-nos-p.... Acesso em: 8 nov. 2021.

2 GARCIA, CecĂ­lia. “Letramento racial Ă© um ato anticolonialista”, explicam Diva GuimarĂŁes e Diane Sousa. Portal Aprendiz, 22 out. 2019. Transformar a cidade. DisponĂ­vel em: https://portal.aprendiz.uol.com.br/2019/10/22/letramento-racial/. Acesso em: 8 nov. 2021.

3 SILVA, Marcos FabrĂ­cio Lopes da. Boletim, Universidade Federal de Minas, n. 2081, ano 46, 18 nov. 2019. DisponĂ­vel em: https://ufmg.br/comunicacao/publicacoes/boletim/edicao/2081/educacao-e-l.... Acesso em: 8 nov. 2021.

4 VICENTE, JosĂ©. Carrefour, a nova rĂ©gua contra o racismo empresarial. Veja, 17 jun. 2021. Blog. DisponĂ­vel em: https://veja.abril.com.br/blog/jose-vicente/carrefour-a-nova-regua-contr.... Acesso em: 9 nov. 2021.

 5 DELBONI, Carolina. Movimento de Escolas Antirracistas começa ano letivo com mais negros nos colĂ©gios. EstadĂŁo, 22 fev. 2021. Blogs. Kids. DisponĂ­vel em: https://emais.estadao.com.br/blogs/kids/movimento-de-escolas-antirracist.... Acesso em: 9 nov. 2021.

6 SENA, Victor. Veja 6 passos para promover igualdade racial dentro das empresas. Exame, 20 nov. 2020. Carreira. DisponĂ­vel em: https://exame.com/carreira/veja-6-passos-para-promover-igualdade-racial-.... Acesso em: 9 nov. 2021.

7 O GLOBO. Nem ‘afrogoogle’, nem ‘wikipreta’: mulheres negras tĂȘm muito mais a dizer alĂ©m de racismo. Celina, 25 jul. 2020. DisponĂ­vel em: https://oglobo.globo.com/celina/nem-afrogoogle-nem-wikipreta-mulheres-ne.... Acesso em: 9 nov. 2021.